Simpatia de Giz (Oswaldo Montenegro)
Eu já me enchi de tudo o que você diz
Da tua cara de profeta lá da Praça Paris
O teu jeito de ser o que você queria ser, mas não é
Olha como ET e pensa como perdiz
É o teu jeito de bancar um cara rico e feliz, mas não é
Mete o pau na água e compra um chafariz
Acha que é um rei e ri dos meus bem-te-vis
Acha que é o dono dessa bola que eu não quis, mas não é
Eu não aguento mais tua simpatia de giz
O teu jeito de saber do vento mais que o nariz
O teu jeito de ser o que você queria ser, mas não é
Olha como folha e pensa como raiz
É o teu jeito de bancar um cara rico e feliz, mas não é
Querendo me ensinar aquilo que eu sempre fiz
Usando o que é dos outros pra sonhar e não diz
Fundando a filial querendo ser a matriz, mas não é
O Castelo de Vestal (Oswaldo Montenegro)
No velho castelo de vestal
Entre antigos copos de cristal
Bebem os vampiros e os anões
À saúde do seu rei
Desirée, princesa do local
Namora com a noite e o temporal
Velho inimigo das paixões
Levou seu amado rei
O País dos Canários Amarelos (Oswaldo Montenegro)
Catimanhê, em alopala di
Catinhalohana de vestal e di
Era um canário de amarelo ouro
Era à capela, o coro
O coro enorme que os bichos faziam
Era questão de ser demais
Questão de ser a maravilha e o cais
E o que vale em cada bicho
É a asa
A Lista (Oswaldo Montenegro)
Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais
Faça uma lista dos sonhos que tinha
Quantos você desistiu de sonhar
Quantos amores jurados pra sempre
Quantos você conseguiu preservar
Onde você ainda se reconhece
Na foto passada ou no espelho de agora
Hoje é do jeito que achou que seria
Quantos amigos você jogou fora
Quantos mistérios que você sondava
Quantos você conseguiu entender
Quantos defeitos sanados com o tempo
Eram o melhor que havia em você
Quantas mentiras você condenava
Quantas você teve que cometer
Quantas canções que você não cantava
Hoje assobia pra sobreviver
Quantos segredos que você guardava
Hoje são bobos, ninguém quer saber
Quantas pessoas que você amava
Hoje acredita que amam você
O Carroceiro do Reino (Oswaldo Montenegro)
A mágica ensina o que a lógica evita
Princesa, acredita que viver é bom
Por mais que pareça que a dor é infinita
Princesa, acredita que viver é bom
Pássaro rei avoou!
Pássaro rei
Opereta do Carroceiro e da Dama (Oswaldo Montenegro)
- Um carroceiro que se preza
Deveria ter carroça e saber
De todos os caminhos e ter
Pra onde nos levar
- Uma princesa não devia
Andar sem fada madrinha e não ter
Ao menos um mapinha pra ver
Por onde quer andar
- Ela quer andar
Pra onde o rei espera
E você não vai entender
- Não há quem não entenda uma rainha
God save a rainha
E alguém salve você
- Um carroceiro que se preza
Lhe faria reverências
- Eu fiz
As minha reverências sutis
Você que não entendeu
- Se seu marido fosse vivo aqui
Agora te mandava prender
Um riso como o teu pode ser
Tua condenação
- Se seu marido nos prendesse
Certamente a gente ia morrer
Você de tédio, eu de prazer
De pura emoção
- Eu quero um pingo de respeito
Uma princesa não é uma qualquer
- Princesa, esquece a ama
Me avisa, sobe logo
E eu te levo onde quiser
Banal (O Blues do Travesti) (Oswaldo Montenegro e Mongol)
Quero que se dane a estrutura, a coerência
Que o homem construiu nesse planeta
Olha meu Deus, o pensamento é banal
Todo o pensamento é banal
Quero que a lógica se dane
Olha, princesa, o pensamento é banal
Lógica é sempre o menor pedaço do que o homem
Construiu nesse planeta o resto se perdeu
Meu Deus, o pensamento é banal
Todo pensamento é banal
Quero que a lógica se dane
Olha, princesa, o pensamento é banal
Matemático, andarilho o carroceiro
Seu amigo, mago da intuição
Não pense, o pensamento é banal
Todo pensamento é banal
Quero que a lógica se dane
Olha, princesa, o pensamento é banal
Da cartesiana sensação de coerência
Em que a prudência vale mais
Que andar na corda bamba solta e total
Eu tenho horror é banal
Todo pensamento é banal
Quero que a lógica se dane
Olha, princesa, o pensamento é banal
Sempre não é todo dia (Oswaldo Montenegro e Mongol)
Eu hoje acordei tão só
Mais só do que eu merecia
Olhei pro meu espelho e rá!
Gritei o que eu mais queria
Na fresta da minha janela
Raiou, vazou a luz do dia
Entrou sem me pedir licença
Querendo me servir de guia
E eu que já sabia tudo
Das rotas da Astrologia
Dancei e a cabeça tonta
O meu reinado não previa
Olhei pro meu espelho e rá!
Meu grito não me convencia
Princesa eu sei que sou pra sempre
Mas sempre não é todo dia
Botei o meu nariz a postos
Pro faro e pro que vicia
Senti seu cheiro na semente
Que a manhã me oferecia
Olhei pro meu espelho e rá!
Meu grito não me convencia
Princesa eu sei que sou pra sempre
Mas sempre não é todo dia
Eu hoje acordei tão só
Mais só do que eu merecia
Eu acho que será pra sempre
Mas sempre não é todo dia
O País dos Tristes (Oswaldo Montenegro)
Ah, quando a dor se for restará
Mais do que alma cedeu
Mais do que o mar nunca jamais concebeu
Tudo o que não voltará, nasceu
E a nossa alegria andará
Onde o suor escorreu à deriva
Acende o olhar no breu
Tudo o que não voltará, nasceu
O País das Atrizes (Oswaldo Montenegro)
Cada personagem é o fascínio
E não há quem possa explicar
A mágica do mágico na minha alma de atriz
Há de transformar
A pérola dos olhos ilumina o que eu for
Onde quer que eu vá
E cada personagem é a menina que eu fui
E a que virá
E o rosto da pessoa que eu quero ser
Está em cada rosto que eu me pintar
E cada mil pessoas que eu for fingindo que serei
Eu serei quando alguém vir em mim o que ele será
Letras Brasileiras (Oswaldo Montenegro)
Dez mil rubis
Mil pedras turmalinas
Cem mil cometas
Um milhão de sóis
Dez mil Joões
Mil vidas severinas
Cem mil poetas, todos eles sós
Em procissões, Natais e serpentinas
Dez mil mãos postas
Mães, irmãos, avós
A esperança é profissão e sina
Ensina laços a fingir de nós
São cem cavalos, dez luzes na crina
São luas, muitas luas e faróis
São mil perdões, que aos bons não se incrimina
Cem mil poetas, todos eles sós
Televisões em cada casa e em cima
Parece um bicho a antena
E cada voz
Parece voz que nunca desafina
Na serenata para o seu algoz
Milhões de versos, cem milhões de rimas
No mesmo mar, são dez milhões de anzóis
Pescando alma em dós, bordões e primas
Cem mil poetas, todos eles sós
O País da Esperança (Segue) (Oswaldo Montenegro)
Segue, que esse dia passa
Sem que se perceba eu quase acho graça
Vejo o seu sorriso me guiar na estrada
Pela ventania, última pousada
Viajante só
Segue, que a sua palavra
Já foi quase ouvida e quem caminhava
Alcançou o dia se tornou celeste
Se perdeu por nuvens, se deitou na areia
E adormeceu
As Bruxas (Oswaldo Montenegro)
E na escuridão
Eram doze bruxas dançando em volta de Desirée
E cada uma, então
Era uma hora, um mês, um signo que não se vê
Onde é o Reino dos Mortos? Desirée pergunta
E as bruxas lhe põem a mão
Levantando o corpo e a dor do desejo imenso
Mostrando a porta aberta no coração
A Primeira Estrela (Oswaldo Montenegro)
A primeira estrela apontou pro viajante
Qual é o caminho que leva à beira do mar
Mas três condições ele teria que cumprir para chegar
Ensinar a todos que pedissem seu caminho sem cobrar
Cada fruta boa que ele comesse ia plantar
E a terceira condição era um segredo que ele nunca quis contar
Mas o viajante, quando chegou até o mar
Quis pegar a estrela a quem resolvera amar
E a primeira estrela, que amava o viajante
Jogou sua imagem na água sem pensar
E o que conta a lenda é que justo nesse instante
Nasceu a primeira estrela do mar
País dos Apressados – País dos Vaidosos (Oswaldo Montenegro)