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Oswaldo Montenegro

Ficha Técnica:

Produção independente.
Lançado somente em vinil.
Fora de catálogo.
Produção e gravação: Frank Justo Acker
Capa: Sérgio Feitosa
Arranjos: Oswaldo Montenegro
Gravado na Aliança Francesa da Tijuca, RJ
 

Trilhas (1977)

01.Quantas Vitórias (Oswaldo Montenegro)

Quantas vitórias cantem meus versos
Quantas na mesa ouviram cantar
Nossa bandeira empunha o soneto
Que é de um poeta sem lar.

Carro de boi cantando a tarde fria
Meu caminho percorreu
Negra mão tangendo na viola
Minha emoção mineira
Serenata, minha estrela
São vitórias que guardei

Velho piano e o som da velha casa
Goiabeira no quintal
A mãe preta ralha com o menino:
"Já sujou roupa lavada"
E a sujeira reclamada
É a vitória que guardei

Meu olhar ardendo à meia-noite
Percorrendo a imensidão
Minha voz estala como açoite
Como lenha na fogueira
E vitória verdadeira é enxergar nessa escuridão
 

02.Tá Certo (Oswaldo Montenegro)

Tá certo eu dispenso e renego o baralho
Te compro um vestido e um rádio de pilha
Te beijo na boca depois do trabalho
Semana que vem levo ao circo tua filha
E peço ao patrão um aumento que é justo
Na repartição já sou mais do que antigo
Na feira que vem não reclamo do custo
Podendo não penso e pensando não digo
Esqueço meu sonho e não jogo no bicho
E em vez do Maraca no fim-de-semana
Te ajudo a tirar no quintal todo o lixo
E à noite eu te levo num filme bacana
E finjo que esqueço o aluguel atrasado
E finjo que adoro quem vem me cobrar
Pra morar nessa coisa eu devia ser pago
E a goteira pingando no lar doce lar
Tá certo eu não brigo e não bebo cachaça
Te trago, mulher, a TV colorida
Francisco Cuoco sem cor não tem graça
E só vendo novela tu esquece essa vida

03.Quem Diria (Oswaldo Montenegro)

Seu moço repare ao seu lado
Se o mundo caminha correto
Mas não olhe tão descuidado
Bobeia eu logo lhe espeto
Que a vida não ta pra brinquedo
Um sopro já faz ventania
Valente é quem diz que tem medo
O bom porto não traz calmaria
Não faça pergunta sem nexo
Nem vá responder se não sabe
Que o grande segredo do sexo
É fazer caber se não cabe
E nisto resume-se a vida
No poder fazer quem não pode
No poder amar quem lhe agride
No poder matar quem lhe acode
Enquanto um fala besteira
O outro só filosofa
Enquanto um pula a fogueira
O outro rega a farofa
Enquanto um pula pra briga
O outro pula pros cantos
Enquanto um pede guarida
O outro prossegue aos trancos
Enquanto um sobe no muro
O outro apela pros santos
A gente ensaia pra burro
E o povo vê Silvio Santos
Enquanto um cede à loucura
O outro cede à ganância
O que pro pobre é frescura
Pro rico é trauma de infância

04.Dance (Oswaldo Montenegro)

Dance, dance, dance, dance
Canse, canse, canse, canse que está vida já não passa
De um trailler que já começou
E o filme quase que já não nos interessa
E eu já sei enquanto não começa
Tudo que não vai acontecer
Não adianta forçar o intelecto
A escrever uma coisa genial
Pois o fantasma da tesoura
Assombra tudo que é mortal
E o remédio, o sofisma, quem sabe
É baixar o seu anseio cultural
E se tornar um literato colunista social
Nossa mente no futuro
No cimento se abrirão
Quantas coisas esquisitas
Novas formas soltas pelas ruas tortas
Nossa mente criará
A solitária ilusão
Que no futuro do futuro
O tempo não passará
Quando a vitória se desvia
Sempre volta ao seu lugar
É o que nem nos desafia
Amanhã esconde em sua toca escura
Cada coisa tem dois lados
Ver só um é ilusão
Teu salário atrasado
É o carro do patrão

05.Paço do Rosário (Oswaldo Montenegro)

Êh, beira de rio
Paço do Rosário se avista ao longe
as ruas tortas vão se desenhando pelo arraial
Êh, beira de rio
Paço do Rosário limitando a agreste
sua janela, sua velha doca de barrica e pau
Êh, água barrenta rolando sem pressa consumindo a terra
o pôr-do-sol avermelhando o Paço do Rosário
Êh, na velha igreja já são seis da tarde
o povo reza o terço
Ave Maria, Mãe do Céu, cruz credo!
quem me mata é Deus...
Êh, murmúrio lento, como prece aflita, vai descendo o rio
acompanhando o dia que se vai buscando o anoitecer
E anoitecendo, Paço do Rosário quase silencia
a velha estátua caída na praça, mais um dia
Êh, velha rameira deixa a vela acesa por Virgem Maria
Ave Maria, Mãe do Céu, cruz credo!
quem me mata é Deus...

06.Maria, a Louca (Oswaldo Montenegro)

Maria tem fogo na mente
Seu corpo na espera que o dia não passe
Que a noite não venha, pois dorme sozinha
Encolhe o seu corpo de encontro à parede
O gosto salgado de quem já chorou
Lhe rola na face, lhe causa agonia
E por ironia lhe chamam Maria...
Maria que até já foi nome da mãe do Senhor
Agora é sem nome
É mãe, seu doutor, mas nem sabe de quem
Só sabe que um dia foi linda Maria
Maria de festa, de noite de dança
De rosto rosado, vestido bonito
Maria prendada que agora é perdida
Maria que chamam de louca
Virou brincadeira da turma da rua
Soltou gargalhada, deitou na calçada
Deu grito infinito, gemido profundo
De tão contraído seu rosto se abriu
E se encheu de ternura, pois é, quem diria
De louca Maria restou a poesia
Da moça Maria restou a mulher
 

07.Monsieur Manoel (Oswaldo Montenegro e Mongol)

Monsieur Manel
Arrive en France
Monsieur Manel
Avec la dance
Mas eu me chamo Manuel e moro na praça Paris
Mas é Manel toujours
Mas eu me chamo Manuel e mudei pra Nova Iguaçu

E foi pra Nova Iguaçu e disse merci beaucoup
E foi tomar no seu copo a cachaça inteira do bar
E foi falando besteira no trilho do metrô da Central
E no meio da sua tonteira
Ele achava isso tudo normal
 

08.Abre Alas (Oswaldo Montenegro)

Abre alas, seu moleque
Que agora eu vou passar
Com a língua cuspindo fogo procurando o sol de novo
Eu acho pouco seu luar

Abre alas, seu moleque
Que eu não to chorando, não
Com o que cai desse meu olho
Não se assuste moço eu rego a flor da decisão

Não sorria, seu moleque
Teu sorriso de verão
Que é preciso ser de aço
A ver o mundo no bagaço e não estender a mão

Abre alas, seu moleque
Que na briga eu sou mais eu
Me olhando cara a cara tu vai tremer que nem vara
Depois que o vento bater
 

09.João Sem Nome (Oswaldo Montenegro/Mongol)

Quando eu vim embora
Seu beato disse faça o que o seu coração mandar
Miguel me pediu uma lembrança
E Celina um bocado de sal
Seis anos depois eu recebi notícias
Me dizendo que pai tinha ido embora
Pras terras secas de Nosso Senhor
Pra esses campos de Nossa Senhora
Tonha se casou com Antônio, meu amigo
Marcelino partiu junto com a boiada
Seu lavrador teve mais quatro filhos
Benedito fez mais vinte e seis toadas
 

10.Metade (Oswaldo Montenegro)

Que a força do medo que tenho
não me impeça de ver o que anseio
que a morte de tudo em que acredito
não me tape os ouvidos e a boca
porque metade de mim é o que eu grito
a outra metade é silêncio
Que a música que ouço ao longe
seja linda ainda que tristeza
que a mulher que amo seja pra sempre amada
mesmo que distante
pois metade de mim é partida
a outra metade é saudade
Que as palavras que falo
não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor
apenas respeitadas como a única coisa
que resta a um homem inundado de sentimentos
pois metade de mim é o que ouço
a outra metade é o que calo
Que a minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que mereço
que a tensão que me corrói por dentro
seja um dia recompensada
porque metade de mim é o que penso
a outra metade um vulcão
Que o medo da solidão se afaste
e o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
que o espelho reflita meu rosto num doce sorriso
que me lembro ter dado na infância
pois metade de mim é a lembrança do que fui
a outra metade não sei
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
pra me fazer aquietar o espírito
e que o seu silêncio me fale cada vez mais
pois metade de mim é abrigo
a outra metade é cansaço
Que a arte me aponte uma resposta
mesmo que ela mesma não saiba
e que ninguém a tente complicar
pois é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
pois metade de mim é platéia
a outra metade é canção
Que a minha loucura seja perdoada
pois metade de mim é amor
e a outra metade também
 

11.Casa Assombrada (Oswaldo Montenegro)

Velha casa assombrada, muros por se pintar
Range o porão antigo, ninguém mais chega lá
Velha Maria Louca assombrando de noite
Os moleques da vizinhança jogando bola, zombando
Êh Maria, 'cê não me pega, com a gente 'cê não sossega jamais
Dizem os mais antigos, ter sido a tal Maria
A flor quando a juventude ainda dava a ilusão
De que o tempo ainda cuidava do amor
Dizem que no quintal Maria cultiva flores
Frutas as mais cuidadas, rosas de muitas cores
Dizem, pois a ninguém quis mostrar seu tesouro
E o tempo naquela casa passou ausente dos seres humanos
Com exceção dos moleques jogando bola de pano
Mas quando Maria deixou a velha casa assombrada
Com muito espanto é que viram quintal com campo e baliza
Pra molecada brincar
 

12.Cantiga do Cego (Oswaldo Montenegro e Mongol)

Quando o dia inteiro amanhece
E depois de uma lua cheia
O assombrado cego aparece
E a viola logo ponteia
O assombrado cego Benedito
Desponta e assusta a passarada
Vingando a luz que falta aos olhos
No riso louco que propaga
Eh, mô fio
Eu te enxergo com o coração

- Bom dia cego Benedito.
- Bom dia, fio.
- Cego Benedito, eu tô pensando em ir embora pra outras terras e queria saber se tu acha   certo?
- E quê que tu qué que eu responda, fio?
-O que tu achar que é direito.
- E é direito não deixar que se erre pra que se aprenda? É direito deixar que se erre e se arrependa sem que se aconselhe? Eu não atino o que é direito, por isso não respondo.
- Mas eu quero teu conselho. Se fosse eu, o que é que tu faria?
- Perguntaria a um cego amigo o que fazer.
- E o que este cego te responderia?
- Exatamente o que acabei de responder, fio.
- Mas se tu ainda fosse eu e o cego respondesse exatamente o que acabou de responder?
- Desistia de perguntar. E ai, fio, eu pensava que realmente o que se quer saber não se pergunta. Arranca-se do seio da terra até sentir o cheiro. Se te agrada, fica. Se te espanta vá. Mas não arranque essa cabeça do ombro pensando que assim vai ver mais alto. Não arrede essa perna do tronco pensando em chegar mais cedo. E não procure distante o que já tem do teu lado.
 

13.Canção da Rameira (Oswaldo Montenegro e Mongol)

Clareira de capim queimado
Cheiro de coisa que ardeu
Resto de suor unido
Corpos abraçando o chão
Louca me mordendo a carne
Me trincando os dentes
Me roendo as forças
Me fazendo escravo
Do que eu mais possuo
O sol castigando
E eu desesperado
Te peço desculpas
Pelo corpo sujo
Pela mão barrenta
Com que te rasquei
 

A Lógica da Criação (Oswaldo Montenegro)

O mérito é todo dos santos
O erro e o pecado são meus
Mas onde está nossa vontade
Se tudo é vontade de Deus?
 
Apenas não sei ler direito
A lógica da criação
O que vem depois do infinito
E antes da tal explosão?
 
Por que que o tal ser humano
Já nasce sabendo do fim?
E a morte transforma em engano
As flores do seu jardim?
 
Por que que Deus cria um filho
Que morre antes do pai?
E não pega em seu braço amoroso
O corpo daquele que cai?
 
Se o sexo é tão proibido
Por que Ele criou a paixão?
Se é Ele que cria o destino
Eu não entendi a equação
 
Se Deus criou o desejo
Por que que é pecado o prazer?
Nos pôs mil palavras na boca
Mas que é proibido dizer

(Ora pro Nobis, Ora pro Nobis)
 
Porque, se existe outra vida,
Não mostra pra gente de vez?
Por que que nos deixa nos escuro
Se a luz Ele mesmo que fez?
 
Por que me fez tão errado
Se d'Ele vem a perfeição?
Sabendo, ali quieto, calado
Que eu ia criar confusão
 
E a mim, que sou tão descuidado,
Não resta mais nada a fazer
Apenas dizer que não entendo
Meu Deus, como eu amo você

14.Quem Diria (Oswaldo Montenegro

Seu moço repare a seu lado

Se o mundo caminha correto

Mas não olhe tão descuidado
Bobeia eu logo lhe espeto
Que a vida não tá pra brinquedo
Um sopro já faz ventania
Valente é quem diz que tem medo
O bom porto não traz calmaria
Não faça pergunta sem nexo
Nem vá responder se não sabe
Que o grande segredo do sexo
É fazer caber se não cabe
E nisso resume-se a vida
No poder fazer quem não pode
No poder amar quem lhe agride
No poder matar quem lhe acode
Enquanto um fala besteira
O outro só filosofa
Enquanto um pula a fogueira
O outro rega a farofa
Enquanto um pula pra briga
O outro pula pros cantos
Enquanto um pede guarida
O outro prossegue aos trancos
Enquanto um sobe no muro
O outro apela pros santos
A gente ensaia pra burro
E o povo vê Sílvio Santos
Enquanto um cede à loucura
O outro cede à ganância
O que pro pobre é frescura
Pro rico é trauma de infância

O Azul e o Tempo

Nada pra se acreditar

Mas o tempo não manchou o azul

Nada pra se acreditar

Mas o vento baila o mar azul

Nada pra se acreditar

Mas tá tudo azul

 

Nada pra se acreditar

Mas a fé tingiu o azul de anil

Nada pra se acreditar

Mas os santos rezam pro Brasil

Nada pra se acreditar

Mas você já viu

 

Tudo que vai rebrilhar

Tudo que vai renascer

Tudo que vai nos salvar

Sem que a gente espere

 

Canta pra comemorar

Grita para amanhecer

Solta o choro da alegria

Que a paz adere

Balada Para Um Ex-Amor

Fala da sua dor, que eu conto o que passei

O tempo passou por nós como o vento

Quebrando o telhado que abriga a esperança

Ri desse nosso amor meio bandido e rei

Fala com a minha voz

Quero ver nosso passo trocado bailar nossa dança

E você sabe que me preparou pra paixão que virá

Pode ser que machuque o coração não poder mais voltar

E serenos de tanta dor, esgotados de tanta paz

Nos veremos de longe

E a cor do passado não existe mais

E tudo o que não durou era pra não durar

Leva o que te restou

Que comigo eu levo o que cabe e não pesa e nem cansa

E tudo o que não falou era pra não falar

E tudo o que nos sobrou é o espaço onde a gente não cabe

E a memória não alcança mais

 

E serenos de tanta dor, esgotados de tanta paz

Nos veremos de longe

E a cor do passado não existe mais

E tudo o que não falou era pra não falar

E tudo o que nos sobrou é o espaço onde a gente não cabe

 

E a memória não alcança mais